Na varanda

Estava absurdamente ansiosa. Não sabia dizer exatamente se era ansiedade o que sentia mas, sentia um agito dentro do peito… (aquela sensação de não saber exatamente o que aconteceria em seguida e que deixa-a agitada sempre). Normalmente ela degustava essa sensação como se fosse um doce quente, caramelizado, que se come com colher e que exige que para aproveitá-lo até o fim a língua e a boca toda esforcem-se – num esforço fácil e prazeiroso – ao morder, lamber e beijar a colher pra tirar dela todo o doce sabor. Normalmente esse agito dentro do peito faziam-na sonhar sonhos frenéticos mesmo sem ter por eles um apego definitivo; sonhava variações do que a iminente mudança poderia significar. E, desfrutava essa sensação simplesmente porque esse agito podia sempre ser o aceno de uma mudança e, por mais assustadora que uma mudança possa ser, isso sempre enchia seu coração e seus olhos de esperança. (Eu diria: Oh, esses malditos românticos incuráveis…!)

Ele foi a primeira pessoa com quem ela quis falar. Telefonou, esperou tocar duas vezes e escutou a conhecida voz com um tom de surpresa:

– Oi, querida!

– Oi. Tudo bem? Pode falar?

– Claro.

– Está em casa?

– Ainda não. No trabalho.

– Puxa, que pena! Estou passando pertinho… queria te ver.

– Eu te ligo quando sair então.

Algumas horas mais tarde estavam na varanda do apartamento dela. Conheciam-se há anos. Haviam passado por diversas coisas… Dividiam tantas memórias, tinham tanto em comum… Sabiam-se amigos, de verdade. Apesar disso, depois de falar sem parar sobre tudo o que estava acontecendo em sua vida (e não era muito) ela sentiu-se tonta e nervosa como se tivesse lhe oferecido um olhar panorâmico sobre seu universo particular numa velocidade rápida demais. Acendeu um cigarro e esperou que o tragar e o expelir daquela fumaça com gosto de cinzas ajuda-se-lhe a regrar a respiração. Tentou concentrar-se na pequena luz vermelha da ponta do cigarro. Ele sorriu e abraçou-a. Estar dentro dos braços dele, encostada em seu peito, sempre lhe trouxe o sentimento de estar em casa. Ficaram assim durante alguns minutos, em silêncio. Ela perguntava-se se ele podia sentir seu coração acelerado. Ele a soltou e começou a contar do que estava se passando nos seus dias… sem revelar muito do que era importante; só projetos e trabalho. Não era necessário naquele momento. Era importante simplesmente aproveitar estarem juntos.

– Preciso ir, ele disse.

– Pode ir, se quiser. Respondeu como se não se importasse.

– Você sabe que eu quero ficar.

Ela fez uma careta mas, no canto da boca escapou um sorriso… ela não queria dar o braço a torcer mas sabia que era verdade. Era tanto para ele quanto era para ela.

– Vamos então. Te levo até a porta.

– Se cuida, tá?

– Tá. Você também.

Nunca sabiam quanto tempo até se encontrarem de novo. Ele abraçou-a e, antes que se afastassem, ele lhe deu um beijo. Só quando os lábios se afastaram é que ela se deu conta do que tinha acontecido. Mas não estava surpresa com o beijo. Ao contrário, estava surpresa em como o beijo entre eles era algo tão natural. Ficou com aquela surpresa dentro de si durante toda a noite… – aquela sensação de doce quente e caramelizado – mesmo sabendo que ainda naquela noite cada um deles estaria beijando outras pessoas, beijando àquelas a quem eles de fato pertenciam.

na varanda

Photo: http://cockwhip.tumblr.com/post/16600582583/cockwhip-cockwhip


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